segunda-feira, 24 de abril de 2017

Ainda que...


Ainda que não me vejas
Ainda que doridos os olhos
Ainda que a cegueira te pareça só um episódio da vida real
Ainda que sofrido o corpo
Ainda que disfuncionais os sentidos
Ainda que acorrentados os braços

Tudo retornará ao tempo do mar fundo
Tudo se moverá tal como um rio
Tudo se entregará à morada do corpo
Tudo se eternizará como brisa matutina por dentro dos olhos
Tudo se consumirá por dentro de um fogo, que não arde, antes te purifica.
Tudo se concluirá nas palmas das mãos
Tudo se parecerá com o futuro ainda escrito num vento que não é o vento, antes um espírito liberto.

Ainda que tudo pareça ilusão
Ainda que tudo seja como a lua a nascer na escuridão
Ainda que tudo seja irrequieto no teu corpo
Ainda que a fome te seja à boca
Ainda que a sede te seja ao corpo
Ainda que nostálgicos os pensamentos
Ainda que por breves momentos te sintas a cair no vazio
Ainda que por um passado te sintas traído
Ainda que te saibas a caminhar no deserto
Ainda que enterrada seja ali a tua voz
Ainda que te sintas água em vez de fogo
Ainda que te sintas terra em vez de ar
Ainda que não te saibas enchente na volta das marés
Ainda que não te reconheças um corpo presente
Ainda que o passado seja um livro esquecido e amarelecido

Ainda que o futuro seja um cálculo errado nos nossos  dedos
Tudo voltará a ser, como se nada tivesse sido
Tudo serão como águas passadas ainda a fazer furor num livro de memórias
Tudo será na revolta da terra, como no alvoroço dos mares
Tudo deixará de ser o caos
Tudo será escrito de novo nos céus
Tudo será como sempre imaginamos, tu e eu
Tudo se afirmará no corpo da Ode escrita na luz que pereceu
quando de nós se esqueceu

Onix/dm

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