quarta-feira, 20 de abril de 2016

Nem tudo é em género…(género)

Já o Todo se encontrava na masturbação ocular de um olhar, com maior incidência nos espaços fechados. Sequer os traços marcados nas minhas mãos admitiam um novo tracejado, capaz de acelerar o tempo já consumido por outro destino. Momentaneamente, caladas as vozes seguiam rio afora, sem demoras, nem correntes admoestadas pelos ventos que chegavam de cima, onde tudo se completara, quando a tempestade decidira esburacar os caminhos. 

Sequer as minhas mãos sabiam onde se demorar. Tinham desaparecido todos os colos fechados. Nada havia para lá desse olhar, onde as forças obscuras eram simplesmente a negação plena de uma vida em construção.

Já os corpos amantizados, se debatiam nesse concubinato, em leitos castrados pelo tempo em falta. Uma vida incompleta de cansaços e esperas desmedidas. Tudo agora, era em demasia coisa pouca, quimeras, soma de nadas, sonhos desflorados por conta de uma verdade acorrentada em mares outrora navegados.
Os pecados são ainda castigados pelas mãos, onde traçado o destino, ali deixara a sua marca, cuja união nunca foi exaltada por um além continuado. Só as marcas da indiferença, onde tudo se consome, até mesmo o sol, cujo foco principal se insinua colado nos nossos olhos, porém, sem a lua por perto.

A noite demora-se em espaços abertos, onde todos dormem esquecidos dos sonhos inacabados. Que estigma este, onde se contradizem em versos molhados, escritos com a pena, onde as lágrimas rebolam cantadas por um rio que corre só num único sentido. Na limpidez das suas águas, espelham a dor de um amor que se move ainda só por dentro dos corpos estilizados, em químicas perversas de uma pele contraditória à incidência da luz.

Calam-se as vozes, sussurram em dialetos desusados, comunicam-se por códigos encriptados entre calafrios desordenados. No entanto, apesar dos arrufos do tempo, amam o todo ali habituado às amarras de cor preta. Descuidados, os ventos que passam, levam para longe todas as correntes brancas, e esquecem os pontos e os nós acorrentados de cor negra nos seus corpos agora amortalhados.

Ao género feminino pertencem as lágrimas a acasalarem com os olhos, como se em todos os buracos existissem fêmeas com vaginas abertas. Ao género masculino pertencem os olhos, como se todas as correntes não soubessem da foz e ali afundassem o sémen, reincidente. Por ali se demoram os efeitos secundários de uma soma de variáveis incertas, nas costuras de um tempo inadvertido nos olhares todos, onde o sentimento nem sempre cria raízes fundas.

Um misto de incertezas no maior ponto onde todos os géneros amaldiçoados pela fome se limitam a deixar que por eles passem todas as horas. Por isso o tempo decide copular com o vento. Este gigante contratempo assexuado a ejacular nos momentos sufocados de um amor autenticado na foz de todos os rios, com correntes ainda caladas, e não exaltadas pelo Todo…

O Todo desalmado num processo químico soletrado em poemas ao abandono.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Lusco-fusco de um fim de tarde branco

Tive um sonho que me falou, sem precisar desabafar sobre um amor sentido no início da noite. Tudo era acalmia. Tudo se resumira à única saudade de um corpo estranho acabado de nascer.
Sentia esse movimento a despertar desejos ainda em estado latente na minha pele, por não conseguir extrair dali o essencial. Algo, que somente me permitisse segui-lo na sua viagem. Que me permitisse sentir um pedaço da sua história. Esperava que tudo se concluísse e até me conduzisse ao centro. Esse núcleo onde todos os mistérios se tocam, orientando-me os sentidos num embalo simples e belo.

Amo esse fim de tarde a cair no lusco-fusco.

É como se todo o cenário se entregasse às novas correntes passageiras. Centralizadas no espaço ocupado pela nudez dos corpos, entregam-se ao intercâmbio alegórico da ilusão.
Concluo no entanto, que por ter havido um momento distinto nesse fim de tarde, os meus olhos calaram verdades sentidas e não ditas. Nem mesmo quando os corpos se tocavam, no momento exacto da verdade ocular. Tudo se desvanecia quando as pálpebras trancavam medos num fundo invencível. Possuídos por um desejo que os difundisse por todos os quadrantes daquele universo ainda por explorar, onde se constitui o Todo Universal.

Porém, o lugar era ainda habitado por um conjunto desarmonioso das batidas incertas do sentimento.
Calei memórias. Abafei o ar ressequido com as minhas mãos fechadas! Risquei numa tela ainda virgem, vertigens de outros tempos, em que sonhava a preto e branco. Tudo era o inverso do tempo em mim. Tracei nesse contratempo, um momento só meu. Fui andando pelas ruas, onde a noite se estendera no meu corpo. Sentido, sofria, não por medo do escuro, mas por receio de se perder nesse já conhecido degredo.
Naturalmente a carne tremia. Os ossos todos em sintonia, como se a fome habitasse um beco onde tudo ali se consome. O pensamento era agora o limite do corpo. Ora fingia dormir, ora ensaiava todos os momentos abertos ainda do corpo, que não era achado nem tido pelo seu nome. Aberto em todos os poros da sua pele, enfrentou o enredo, a contracenar nos calabouços. É onde sempre se cola nos muros, a sequência habitual dos seus segredos ocultos.

A nudez presente admitiu-se no único lugar onde o fim da noite deixa de ser segredo, por quantos pontos se tocarem no momento da verdade. O sonho partiu e levou com ele todos os momentos ainda vivos, e não traídos. Nada se trai, quando afloram Invernos longos e nos deixamos levar por aquele movimento inexpressivo dos ventos e das chuvas a caírem desregradas pelos campos. O desfilar de todos os cabelos, contrai-se quando nem um pingo da chuva é relevante no fechar das pálpebras. Os medos calaram as sombras ainda antes do regresso da Primavera.

Os olhos abertos de novo para a luz, abrem as cortinas dos enganos. Espiam todos os caminhos, para o encontro predestinado. A madrugada é fria. Os corpos adormecidos, ainda enlaçados, não sabem quando, nem onde se irão tocar de novo.
O sonho partira na demanda de um ponto que ainda é luz naquele lusco-fusco de um fim de tarde, branco.

ÔNIX