quarta-feira, 20 de maio de 2015

O MEDO

Porque se acomoda neste rio de águas paradas, no lugar onde os aflitos se afogaram e se perde da estrela sibilina? As correntes sufocaram-no. No lodo enterrou os seus pertences, ainda que nada tivesse de seu. Sente frio naquele ermo. Já nada lhe lembra quem foi, ou quem agora é, ou ainda quem virá a ser quando pisar o pó da estrada. 

Encontra-se desajustado do lugar que devia ser o seu. Tentou entrar por um caminho fundo. Ali deixou pegadas e absorveu das paredes que o ladeavam, o perfume dos jasmins. Desencanto seu! Enquanto caminhava, sequer via a cor do pó do caminho. Começou então a andar mais devagar, mas, com os olhos postos no céu. Para espanto seu, este estava agora coberto de nuvens. Ainda assim, procurou um sítio onde pudesse demorar os olhos, descansar as pernas e descalçar os sapatos, que de tanto aperto, lhe incharam e avermelharam os pés. 

Da mochila retirou um livro, cujo encontro presente já fora marco no passado.

Nada, encontrou de novo. Estava fixado nos seus pés agora magoados, feridos. A sorte levou-o a descobrir aquele caminho novo, porém nada o demoveu de continuar a aspirar tal perfume raro. Não reparou, que os jasmins tinham dado lugar a novas flores espalhadas pelo chão. Estava ali, aquele tapete de pétalas perfumadas, cuja essência seria a cura de seus pés magoados. Confundiu-se todo com aquela mudança. Decidiu então caminhar com um passo mais ligeiro. Não viu algo que lhe indicasse um nada que fosse novo.
Para trás ficava a sua vontade de continuar a ler aquele livro antigo. Folhas amarelecidas, história repassada e mais que atabalhoada, sem incentivo que lhe vincasse um sorriso, mesmo que disfarçado por conta da dor que sentia. Deixou-o entregue à sua sorte.

Nisto, caminhava no mesmo sentido, alguém, que sem pés no caminho, avançava sem pretensões de chegar a lugar algum, se não ao fundo de um caminho, onde pudesse descansar e entrar bem fundo nas páginas daquele livro antigo. Ia ao encontro de outros mundos, mesmo que para isso, se confundisse com os vários momentos, ali inscritos. 

Foi então que perdeu o medo. Assegurou-se das várias correntes que por si deslizavam, agora mais firmes no seu propósito de o fazerem ir mais além.

ÔNIX


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