segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Apresentação da autoria de Graça Pires, no lançamento de: Homem-Árvore

Apresentação da autoria de Graça Pires, no lançamento de: Homem-Árvore
"“Homem-Árvore” Carlos Teixeira Luís´

Sábios os caminhantes
os que não param na sombra
nem na curva da estrada verde  […]
Assim começa o livro Homem-Árvore de Carlos Teixeira Luís.
É o 3º livro do poeta, que publicou em 2008 Tijolos de verde rudee em 2009 Histórias do deserto.
Homem-Árvore. Qual o motivo da escolha deste título? Nos interrogamos todos.
Sabemos que a direção da luz e do vento indicam de que lado irá crescer uma árvore. A luz e o vento são metáforas que assentam bem na comunicação estabelecida entre estes poemas que associam intimamente a vida e a linguagem.
 […] um homem árvore feito raiz mistérios de luz que a poesia sublima[…], refere o poema da p.42 ou, então, lemos na p.74:
Quando o vento oferece árvores
ao meu caminho é a hora tardia de
fechar os cantos de sombras do bosque […]

Homem-Árvore. Porque, certamente, a poesia transmite, à vivência do autor, a verticalidade de um tronco que não verga perante a inconsistência dos sonhos.
Falar de poesia é uma tarefa problemática, mas muito estimulante.
Não vou entrar em análises teóricas ou técnicas. Vou ficar-me pelas emoções, pois os poemas têm o poder de reconfigurar os nossos sentidos.
O autor poderia dizer como Herberto Helder: “A manhã começa a bater no meu poema. As manhãs, os martelos velozes, as grandes flores líricas. Muita coisa começa a bater contra os muros do meu poema”.
Penso poder afirmar que, neste livro, a poesia é o fio condutor de todo o texto. Como se fosse poesia da poesia que ajusta a estética a uma ética pretendida. Nele (no livro) se esconde e se revela um dinamismo singular, em que os poemas se abrem à nossa sensibilidade, atingindo frontalmente quem os lê.
Podemos seguir o poema da p. 14.
Ninguém dá por nada – pelo fio de luz
da janela ao canto do móvel com memórias
retratistas pelo choro na madrugada fria de gente
pelo gemido pelo último gemido dum crepúsculo
pelo brilho da calçada e dos passos corridos
para a estação das névoas pelo sorriso tímido
duma mulher feliz que diz adeus com a sua sombra
pelo gato que já não caça o pó dançante
porque adormeceu pelo poema fechado
no abrupto mundo do livro esquecido
Ninguém dá por nada até darem por si 
no olho do furacão e serem domesticados
pela própria borrasca.

Nas palavras de Carlos Teixeira Luís somos levados, de forma subtil, numa peregrinação da linguagem, em busca da compreensão do mundo. Linguagem, essa, que é como um fio inesgotável a tecer os dias.
(O poeta finge seu mundo e seu mundo finge que merece o poeta, nos alerta o autor no poema da p.16.
Mas essa busca, que traduz o seu imaginário, é uma busca ansiosa. Um pretexto para nos apresentar a vida em linguagem poética, nos incluir nela e a sobrepor às lembranças que nos cabem. Leia-se no poema da p. 38:
Procuro um tema procuro o tema
não sou nada sem outros será o meu tema 
os outros […]

No entanto, há um cruzamento de vários temas representando um vínculo entre a imaginação e a memória, ou as nostalgias que captam a luz e as sombras.
O poeta recusa o lirismo que se abstrai dos outros, da vida concreta. Porque a poesia quer-se dádiva, promessa, testemunho, aviso. A poesia está atenta às circunstâncias da vida que formam e informam o poeta.

Mesmo não tendo em conta o sentido biográfico, podemos analisar estes poemas como uma projeção da vida na forma como espelham as angústias, a confiança, o modo de estar no mundo.

O poema é melhor que o poeta. Quem o afirma é o autor (p.23) que reclama na poesia o seu espaço criativo, o seu lugar de liberdade, indiferente ao desdém e ao “verbos daninhos” já que
[…] Loucos são os poetas que dizem e
tornam a dizer o indizível são loucos
porque inventam novas palavras para a
palavra amor que ainda seja amor […] (p.32)
Em alguns poemas do livro há a introdução de personagens que servem de mediadoras do poeta que as faz emergir na cena do poema e lhes dá a palavra.
Por ex.: (p. 53) GRITAM AS MULHERES: - eles
matam a rua sangrando-a A guerra
a guerra dos dias travada assim tão impoluta
a guerra que nunca mais nos serve
mas nos sorve.

Ou lamenta o NARRADOR: - 
Volto aos mesmos passos
para onde vou? nem deus nem o diabo
sabe que as pernas calcaram todos estes caminhos de pedra esquecida […] (p.57)
É como se o autor falasse através do sentir das personagens, recuperando, ao mesmo tempo, a sua própria voz, numa espécie de diálogo-monólogo, que imprime aos poemas um ritmo inesperado.
Falar de poesia é uma tarefa problemática, repito.
Falar da poesia deste livro é saber descobri-la. É deixarmo-nos surpreender porque Somos corrente contínua de sangue nervos e sonho (p.19) e Somos folhas de árvore sempre verde. (p. 37).
Podemos, portanto, conceber a leitura deste “Homem-Árvore” como um cerco de sonho e de vida. E de poesia naquilo que ela tem de secreto, de sublime, de absolvição e horizonte de esperança.
[…] Sábia a ode velha cantada por todos 
os ventos mesmo os ventos da noite (p. 26).
Escrever poesia é um acto íntimo onde se confundem a solidão e a partilha, a memória e a emoção.

É o que nos revela Carlos Teixeira Luís, a quem não é alheio o saudável convívio com a leitura de poetas em cujo universo imagético se reconhece.
então retorno ao meu secreto caminho
todas as sombras do bosque nascerão
mais uma vez num novo setembro (p.79)
É com estas palavras que o autor acaba o seu livro.
E eu termino também porque não é necessário acrescentar mais palavras ao sentimento do poeta.
O livro está aqui. À espera que o leiam. Desejo que esta breve apresentação ajude a atrair sobre ele olhares interessados, críticos e cúmplices.
Obrigada.
                                                       7 Setembro 2013
                                                         Graça Pires"

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