Esperava sempre pelo pão na minha mão. Quente a sair do forno.
Dourado tal como o sol que fizera amadurecer as espigas lá nos campos.
Fazia tudo com aquele jeito meio desajeitado, mas tão simples e natural, como é à noite: o nascer e o pôr da estrela, o virar das águas, o esperar pelas hora das levadas, o falar do tempo e para o tempo.
Separava as carquejas secas e ateavas-lhe o fogo, que esvoaçava em brandas chamas por entre o cruzamento dos seus braços.
Iluminado era o rosto do tempo.
Ateado o chão das searas.
Consumido o tempo das colheitas no meio do milheiral.
(Havia espigas de milho espalhadas ainda pelo chão, e casulos secos para ajudar a atear o fogo.)
Era o pão de cada dia nos seus braços.
Era a pedra dura e ressequida a tapar o forno.
Era a bosta de vaca nas minhas mãos. Pedia a todos os santos que não ma mandasse ir buscar.
(Fechava os olhos, enquanto com uma mão tapava o nariz, e com a outra, tentava arrancar do meio de um bosteiro imenso, o suficiente para selar a porta do forno.)
Digo bosta de vaca, porque ali, só elas puxavam o arado e o carro cheio de estrume para adubar as terras. Os bois, havia-os para cobrir as vacas. (Disso nem lembro muito bem. Ela não me deixava ver.)
Era tudo menos tédio naquele espaço. O fumo enchia o ar, até chegar aos meus olhos e os fazer lacrimejar.
E agora tudo é distante. Tudo se esfumou no tempo.
Tudo se lê nas paredes novas, rebocadas e pintadas de branco, “o Fim de um ciclo e o inicio de pouco mais que nada”.
Já não espreito a lua nem as estrelas pelas frestas das lousas, que compunham o telhado de xisto.
Já não vejo o alambique a funcionar.
Já não vejo a água, fazer girar a mó do moinho lá em cima no monte.
Já não vejo a água, fazer girar a mó da azenha, e nem sinto o cheiro nauseabundo das azeitonas moídas, lá em baixo no barroco.
Agora tudo é anestesiante.
Até às margens do rio se deixam corromper e se mostram nuas e oferecidas à nova flora. Dizem que são sinais da evolução, sinais dos novos tempos.
Tudo embarca na mesma poluição, aquela que corrói os caminhos forrados de alcatrão.
Tudo se move em sentido contrário.
Já não vejo as marchas fúnebres, nem ouço o bater das batinas dos padres no chão.
Já não sei como é o cheiro a incenso, quando bato à porta da Igreja.
Já se foi o verão, e com ele, o outono a cair nas mãos do destino.
Rá tomará conta de si
Já a primavera se mostra tímida, com receio de se sumir por entre nortadas fortes. Chegam muitas vezes em Agosto e arrasam tudo.
Uma desolação para que não haja pão.
Para onde irás, agora rosto iluminado pelo tempo? Serás monumento ou simplesmente ruinas e cinzas espalhadas, a Fénix esculturalmente aceite pelo teu chão?
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