segunda-feira, 21 de março de 2016

Ponto de luz

Crer no poder de amar um ponto de luz
como condição essencial e breve
tal a forma de desenhar em cruz
um corpo solto, límpido e leve

Querer a imensidão desse Universo
sem saber como chegar ao lugar
onde já nada é o inverso
nem mesmo a lua numa noite sem luar

Crer na rosa-dos-ventos, agora tão perto
do maior centro desenhado no peito
a dançar nua no infinito longo do deserto

Querer isso tudo e permitir-me ainda assim
geometricamente em círculos e semi-circulos
até ao ponto de o poder sentir em mim

ÔNIX

Centro

Assimilar tudo no movimento dos olhos, quando simplesmente se permitirem desobstruir canais de passagem. Construir caminhos, seguir viagem rumo ao maior centro onde sempre nos esperam, sem roupagens, nem miragens nos sentidos que enchem o vazio dos olhos.

ÔNIX
Imagem: net (Atena)

Luz

Não suporto este fundo a criar enredos, num cenário perpétuo da noite. Quando cai assim nua sobre mim, sei-a leve e solta como eu. Conheço todos os silêncios ali inscritos. Pinto-os em tela, traçando no centro, um círculo, para Te fundir nessa verdade centralizada em todos os desejos promíscuos que crescem com a permissão de Deus, no meu corpo. 
Quando a madrugada se aproxima, já nada me faz permanecer nessa meia verdade, porque o sol chega de mansinho e coloca nos meus olhos, a luz que Tu És. 
O dia abre-se, toma-me por inteiro, a mim e ao desejo ainda a copular com o sonho de te ter sempre por perto.

ÔNIX

Um Poema

Imagina simplesmente um poema
Um poema intemporal
Um poema castigado pelas investidas do tempo
Um poema cantado no tumulto dos mares
Um poema sentido nas correntes de um rio
Um poema a saber-me a menta e a mel, e a fruta, e a canela
Um poema, cujos versos me devolvam o agridoce das amoras silvestres

Escreve o poema
O poema que me faça esquecer do tempo, imperfeito mas pleno de rituais
O poema que descreva a intemporalidade dos sonhos:sóbrio, eloquente, envolvente…com versos de aromas
O poema que se afunde no teu maior fundo

Imprime-me agora o poema
Como se eu fosse a tela dos desenganos, dos amores ali consentidos, sem sentidos, e não desmentidos pelos traços vincados de um pincel
Declama agora o poema
Que me faça sorrir e também chorar
Que as palavras ali nascidas sejam as estrelas da noite
E os versos soletrados, farrapos de luar nos meus olhos
Sente somente
A verdade ou a inverdade desse momento inscrito no meu corpo
A realidade, a ficção, a emoção à flor da pele, quando de olhos fechados te sentires somente o verdadeiro poema

E eu a brisa a dançar nas tuas mãos enquanto pensavas e nada escrevias
Não bebias da fonte onde nasce a poesia
E verso, somente, assim exposto à clara nudez do Poema…fiquei
Fui raiz, de um pensamento, ou simplesmente a desordem de um momento proscrito na face contrária de uma página ainda em branco

ÔNIX

Sonhos meus e teus

Ali, onde só os falcões dominam
A parte mais densa do céu
Onde nem o voo incauto das águias
Ousa saber o caminho do céu

Ali onde só as vozes roucas dos corvos
Anunciam o lusco-fusco nos meus olhos

Ali, onde o meu corpo se aquietou
No desmaiar da imensa conjuntura celestial
Quando no primórdio da noite
O início de Deus ali se anunciou
Naquele lugar primeiro e último
Onde só o tempo ceifa o Pão d’Oiro

(D’Oiro é o tempo a nascer nas eiras)

Ali, onde os meus olhos descansam
Ainda num fundo, tão fundo da noite
À luz de um pano de fundo azul
Onde ensaiam ainda a última coreografia
As pétalas lilases

Ali no tempo dos invernos longos pelos campos
Nasce a derradeira verdade de um sonho
Que a primavera amainou
Quando o verão dele se cansou

Ali, é e sempre será o meu céu
Onde os corvos já não têm voz
E os falcões se perdem na imensa catedral
Do voo da maior águia que ali nasceu
Onde guardados estão os sonhos meus e teus

ÔNIX

segunda-feira, 14 de março de 2016

Memórias

Pudera ter as memórias todas juntas
e saber-te ali um poema
que te pudesse ler nas entrelinhas do tempo
quando caísse sobre mim, somente um verso
que te permitisses num único ponto
onde se desnuda a poesia

Quisera beber na fonte de todas as vontades
onde o Verbo é nascente e verdade em nós
quando naturalmente somos um no outro

ÔNIX