quarta-feira, 25 de julho de 2012

Já me vi em dias de sol


já me vi em dias de sol
sem sol
que pela peneira
se repartia
à tarde no quintal

havia lamúrias
em surdos
que pareciam vento
nas levadas

havia silêncios
no entardecer
que brincavam
às escondidas
nos arvoredos

havia caminhos longos
a fazerem-se breves
nos meus passos
ainda frescos

já me vi em dias de sol
sem sol
que pela manhã
enchia as colinas

havia gigantes
adormecidos
no caminho
das giestas

havia trôpegos
corpos
a escutar
o canto dos pássaros

havia gente
que não se sabia
ser gente

já me vi em dias de sol
sem sol
a sacudir
o sino da capela

havia chuvas
pelos campos
a encher
as últimas pegadas

havia raízes tenras
a nascer
nas enseadas


já me vi em dias de sol
sem sol
a engolir
os últimos sacramentos

havia as indomáveis
árvores
ainda de pé

havia a brisa
nas suas folhas
ressequidas

havia chocalhos
escondidos
nos matagais


já me vi em dias de sol
Sem sol

a haver
será só um único
ponto
onde o olhar
se perde
no horizonte